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Se a Índia utilizasse os padrões
fixados pelo IDH de 2012 para fixar a pobreza,
haveria 55% de pessoas nessa situação. Foto: Sujoy Dhar/IPS
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por Isolda Agazzi, da IPS
Se a Índia utilizasse os padrões fixados pelo IDH de 2012 para fixar a pobreza, haveria 55% de pessoas nessa situação. Foto: Sujoy Dhar/IPS
Genebra, Suíça, 25/5/2012 – Organizações da sociedade civil da Índia denunciam a enorme brecha entre o crescimento econômico e a pobreza, a desnutrição e a falta de serviços de saúde e saneamento, no contexto de novo Exame Periódico Universal do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU).
“Segundo dados oficiais, o crescimento médio entre 2007 e 2011 foi de 8,2%, mas a pobreza só diminuiu 0,8%”, disse Miloon Kothari, coordenador do Grupo de Trabalho sobre Direitos Humanos (WGHR) na Índia, ex-relator especial da ONU sobre Direito a Moradia Adequada.
“Além disso, o método padrão para medir a pobreza se baseia em 50 centavos ao dia, um insulto”, lamentou.
O WGHR foi criado há três anos por organizações não governamentais, para preparar o segundo Exame Periódico Universal sobre a situação dos direitos humanos em cada país, que aconteceu ontem na sede do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra.
Em um relatório de 170 páginas, as organizações indianas se mostram preocupadas com o desenvolvimento desigual da Índia, e denunciam que o método para medir a pobreza não é consistente com os padrões universais, nem se ajusta a um enfoque de direitos humanos.
Se a Índia seguir os padrões fixados pelo Informe de Desenvolvimento Humano (IDH) de 2012, a pobreza alcançará 55% da população, observou Kothari.
“Há uma obsessão com o crescimento e o 11º plano quinquenal não se afasta disso. Não deveria ser um fim em si mesmo, mas uma forma de conseguir objetivos em matéria de educação e saúde”, afirmou.
“Inclusive o Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen disse que as estatísticas de pobreza da Índia são muito controvertidas e pouco confiáveis. Deve haver uma mudança radical”, ressaltou.
A Índia está em 134º lugar entre 187 países no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU.
Uma das principais consequências da pobreza é que atenta contra o direito à alimentação. A Índia tem a maior quantidade de pessoas desnutridas, mal que afeta 21% da população.
Além disso, 42% dos menores de cinco anos apresentam baixo peso.
“Em nosso país, o direito à alimentação está na lei, mas a realidade mostra que temos excesso de grãos e um mecanismo de distribuição muito pouco satisfatório. Falta apoio ao setor agrícola e há uma fome que comove e é piorada pela biotecnologia”, alertou Kothari à IPS.
O coordenador do WGHR considera que os acordos de livre comércio são uma nova ameaça porque nem a população e nem o parlamento são consultados.
Além disso, “não são consistentes com as obrigações em matéria de direitos humanos”, acrescentou.
A negação do governo em universalizar a distribuição de grãos, apesar do excesso de reservas, é “inaceitável”, destacou.
Em matéria de água e saneamento, a Índia alcança outro pódio vergonhoso: tem a maior quantidade de pessoas que defecam ao ar livre, 51% da população.
Em zonas rurais, 60% das casas carecem de privadas, um problema que afeta especialmente os dalits, situados na escala mais baixa do sistema de castas e que representam 16,3% da população, disse Asha Kotwal, secretária-geral do Fórum de Direitos das Mulheres Dalits de Toda Índia.
No papel, os dalits e o povo originário adivasi se beneficiam de uma grande quantidade de recursos estatais, mas nos últimos cinco anos deixaram de receber cerca de US$ 30 bilhões.
“É hora de expor a crueldade do sistema de castas”, afirmou Kotwal.
“A cultura de impunidade afeta toda a sociedade. O Estado, a justiça e a mídia discriminam seguindo esse padrão.
O maior crescimento significou uma rápida exclusão para nós mulheres.
Necessitamos de uma legislação contra a discriminação ou uma lei de igualdade”, enfatizou.
O processo de desenvolvimento da Índia, que depende em grande parte da exploração de recursos naturais, levou ao deslocamento e despojo de milhões de indígenas em todo o país, afirmou Prafulla Samantra, presidente do Movimento de Empoderamento do Povo.
“As multinacionais estão cada vez mais interessadas em investir no centro do país, em Estados como Orissa e Andhra Pradesh. A Lei de Direitos das Florestas, de 2006, reconhece alguns direitos, mas não é totalmente cumprida, e as empresas adquirem terras.
Muitos indígenas foram atingidos por disparos da polícia em defesa” dos interesses corporativos, acrescentou.
Além disso, “com a crescente concentração de terras, é preciso redefinir o interesse público”, disse, por sua vez, Madhu Mehra, diretora da Partners for Law in Development. A sociedade civil também se preocupa pelo fato de a Índia não cumprir suas obrigações em matéria de direitos humanos.
“O país ainda não ratificou a Convenção contra a Tortura”, contou a advogada especializada em direitos humanos Vrinda Grover.
“É preocupante, porque as forças de segurança recorrem à tortura de forma habitual na Índia. Mas é especialmente sistemática e brutal em áreas conflituosas como no nordeste, em Jammu e Caxemira, e no centro do país”, indicou.
“Os desaparecimentos forçados, as detenções arbitrárias, os assassinatos extrajudiciais e a violência sexual continuam arraigadas nessas áreas.
A Índia deve ratificar a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados”, opinou Grover.
“Este país tem enormes desafios em matéria de direitos humanos”, destacou Kothari.
“O segundo Exame Periódico Universal oferece uma grande oportunidade para reconhecer seus defeitos e passar de um enfoque defensivo para outro de colaboração com as Nações Unidas”, concluiu. Envolverde/IPS
(IPS)